Contra o pagamento de auxílio-moradia aos magistrados do Paraná

 

Auxílio-moradia aos magistrados do Paraná deveria ser cancelado

Auxílio-moradia aos magistrados do Paraná deveria ser cancelado

No dia 27 de setembro, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ/PR) decidiu que pagará auxílio-moradia aos desembargadores e juízes do Estado, no valor de 15% (quinze por cento) dos vencimentos. Com a medida, os juízes em início de carreira no Paraná, que atualmente recebem salário bruto de R$ 22.797,33, poderão ganhar até R$ 26.216,92 mil mensais. Por sua vez, os desembargadores do TJ, que recebem R$ 26.589,68, poderão receber até R$ 30.578,13 por mês.

A instituição do auxílio-moradia pelo TJ/PR somente foi possível depois que a Assembleia Legislativa do Estado aprovou e o Governador sancionou a Lei Estadual n.º 17.691/2014. A Lei altera o Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado (Lei Estadual n.º 14.277/2003) e inclui o benefício entre as vantagens que podem ser pagas pelo Poder Judiciário no Estado. Em nota divulgada em sua página na internet, o TJ/PR argumentou que o pagamento do auxílio-moradia já era previsto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n.º 35/79), e que 14 Tribunais do país pagam o benefício a seus juízes.

Apesar das declarações do TJ/PR, a instituição do auxílio-moradia é absolutamente injustificável do ponto de vista moral e causa indignação na população do Estado. A previsão do benefício na Lei Orgânica da Magistratura (a qual é anterior à Constituição Federal, frise-se) e, agora, no Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado, não altera em nada a reprovável atitude do TJ/PR de procurar instituir o benefício, e da Assembleia Legislativa e do Governador em consentirem com a medida.

É impossível explicar à população paranaense por que um juiz ou um desembargador devem receber para residir na cidade onde precisam trabalhar. Somam-se a isso outros benefícios a que os membros do Judiciário têm direito, como um excelente salário, (inexplicáveis) dois meses de férias e aposentadoria com vencimentos integrais, e o resultado é revoltante.

Mais do que isso: a situação pode trazer graves prejuízos à própria prestação jurisdicional em nosso Estado. Estamos proporcionando aos nossos juízes que vivam em um mundo fictício, descolado da realidade brasileira. Enquanto o cidadão comum recebe um salário baixo e lida com inúmeros riscos econômicos em sua profissão, seja como empregado, profissional liberal ou empresário, nossos juízes mantêm um patamar de vida alto, não pagam despesas administrativas (água, luz, telefone e mão-de-obra são pagas pelo Poder Judiciário) e não correm qualquer risco financeiro.

Não estou dizendo que os membros do Poder Judiciário devam ganhar mal. Ao contrário: é importante que a profissão seja atrativa, e que nossos juízes possam manter sua independência financeira. A propósito, conheço pessoalmente diversos magistrados, e a grande maioria deles é honesta, dedicada e competente. Mas estou afirmando, sim, que a concessão de benefícios desarrazoados aos juízes é ruim para o Estado.

A separação dos estilos de vida de magistrados e cidadãos tem sido tamanha que, daqui a pouco, nossos juízes não conseguirão realizar o fundamental exercício de colocar-se no lugar das partes em conflito antes de julgá-las.

A remuneração atualmente paga aos juízes paranaenses não é apenas muito superior à praticada na iniciativa privada, como se equipara à remuneração dos juízes federais dos EUA, país dono do maior PIB do mundo (e que paga seus magistrados em dólares, frise-se). A constatação pode ser comprovada por meio de consulta ao site do Poder Judiciário norte-americano (os valores indicados no site são anuais): http://www.uscourts.gov/JudgesAndJudgeships/JudicialCompensation/judicial-salaries-since-1968.aspx

Outras consequências negativas

A previsão do auxílio-moradia aos magistrados paranaenses ainda tem outras consequências negativas. Instituído na forma de ajuda de custo, o benefício é considerado pela Lei como uma indenização pelo trabalho. Com isso, o valor não entra no cálculo do teto remuneratório dos servidores públicos do Brasil, fixado pela Constituição Federal.

De acordo com a Constituição brasileira (art. 37, XI), nenhum servidor público no país pode receber subsídio mensal superior ao de um Ministro do Supremo Tribunal Federal, que hoje é de R$ 29.462,25 mensais (art. 1.º, II, da Lei n.º 12.771/2012). Não entram na conta, no entanto, as supostas indenizações, como o auxílio-moradia. É por isso, aliás, que os desembargadores do TJ/PR já estão ganhando mais do que o teto constitucional.

Uma segunda consequência negativa da instituição do benefício é que outras categorias de altos servidores públicos deverão seguir o mau exemplo e tentar instituir o benefício a seus integrantes. Foi o que o Ministério Público Estadual, a propósito, já declarou que vai fazer.

Para evitar os diversos problemas mencionados no texto, é preciso que a Assembleia, imediatamente, revogue a Lei que autorizou a instituição do benefício.