Células de cordão umbilical perdem espaço nos transplantes de medula óssea

Maior oferta nos cadastros de doadores e tecnologias que permitem cirurgias com parentes 50% compatíveis diminuem necessidade dos bancos de cordão umbilical

Embora tenham cumprido um papel importante no Brasil do começo dos anos 2000, os bancos de cordão umbilical perderam espaço como fontes de células-tronco hematopéticas para os transplantes de medula óssea. Em seu lugar, estão sendo adotadas formas de transplante mais modernas e que apresentam melhores resultados. É o que dizem especialistas ouvidos na audiência pública “Banco de Sangue de Cordão Umbilical”, promovida pelo deputado Homero Marchese (PROS) na Assembleia Legislativa.

O médico Décio Lerner, chefe do Centro de Transplante de Medula Óssea (CEMO) do INCA (Instituto Nacional do Câncer José de Alencar Gomes da Silva) e coordenador da rede BrasilCord, lembrou que os bancos de cordão umbilical viveram um “boom” não só no Brasil. “O mundo inteiro passou a criar bancos de cordão umbilical percebendo que eles eram fonte importante de células-tronco hematopéticas. Mas, na Medicina, as coisas são dinâmicas. Hoje se discute como utilizar esses bancos de cordões. A tendência é utilizar muito pouco como fonte de células tronco porque surgiram outras opções mais baratas, mais práticas e com resultados melhores ou iguais.”

O transplante de medula óssea, tecido que ocupa o interior dos ossos e garante a produção de componentes do sangue, como hemácias, leucócitos e plaquetas, é indicado para o tratamento de doenças como leucemias, linfomas e mielodisplasias, que afetam justamente as células do sangue.

O médico hematologista Giorgio Roberto Baldanzi, ex-chefe do Serviço de Hemoterapia do Hospital de Clínicas (HC) que participou da implantação do Banco de Cordão Umbilical na entidade, tem um diagnóstico semelhante. “Até o final dos anos 90 houve interesse grande no sangue do cordão umbilical porque havia dificuldade com doadores. Não tinha quantidade expressiva. Hoje temos quase 39 milhões de doadores de medula em todo mundo”, explicou.

A enfermeira Juliana Ribeiro Giugni, coordenadora da Central de Transplantes do Paraná (CET/PR), apresentou, na audiência, um resumo dos transplantes de medula realizados desde 2000 no Paraná. Foram 1653 transplantes autólogos (quando o próprio paciente é o doador), 1420 alogênicos aparentados (quando a doação é feita por um parente), 984 transplantes alogênicos não-aparentados (quando o doador foi encontrado por meio do Redome, o cadastro nacional de doadores) e apenas 15 de sangue de cordão umbilical. “No ano passado todo tivemos apenas um transplante proveniente de sangue de cordão umbilical”, lembrou Juliana.

Para o diretor de Gestão em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde (SESA), Vinícius Augusto Filipak, tecnologias como a do banco de cordão umbilical deixaram ser viáveis na realidade do SUS. “Há tecnologias paralelas a essa [do cordão umbilical] que tem um custo muito melhor para a população”, disse.

AVANÇO
A médica hematologista Lenisa Albanske Raboni, atualmente responsável técnica do Centro de Processamento Celular do HC UFPR, destacou que um dos avanços importantes dos últimos tempos tem sido a realização de transplantes alogênicos (que envolvam um doador) com compatibilidade genética na casa dos 50% e não 100%. São os chamados transplantes haploidênticos.

“A chance de um irmão ser 100% compatível é de 25%, de ser 50% compatível é exatamente 50% e de não ser nada compatível é 25%. Então você amplia de 25% para 75% de chance de achar doador na família com o haploidêntico”, disse Lenisa. A médica afirma que os hospitais têm realizado essa modalidade de transplante com bons resultados. “Em relação aos transplantes de cordão umbilical [o haploidêntico] se sobrepôs, com resultados semelhantes, sendo acessível e com menos custos.”

IMPORTÂNCIA DOS DOADORES
A diretora do Hemepar (Centro de Hematologia e Hemoterapia do Paraná), Liana Andrade Cabres de Souza, fez um apelo por mais doações de sangue no estado. Ela lembrou que pacientes com doenças que atacam o sangue, como as facilformes, caracterizada por alterações nos glóbulos vermelhos, necessitam constantemente de sangue até que se encontre um doador de medula óssea. “Na pandemia houve uma redução de 30% dos doadores. Não cancelamos nenhuma cirurgia ou transfusão de sangue, mas precisamos de estoques mais altos”, afirmou.

Juliana Ribeiro Giugni destacou, por outro lado, o número de voluntários cadastrados no Paraná como doadores de medula óssea no estado. São cerca de 557 mil no estado. Segundo ela, é o melhor índice do Sul do Brasil.

A médica Luana Alves Tannous, também do CET, chamou a atenção para o procedimento de doação da medula, caso o doador voluntário seja efetivamente chamado para a concretização do procedimento. “A coleta da medula é feita de dentro de um osso, geralmente o do quadril, com um procedimento cirúrgico pequeno e anestesia local. Não é um procedimento que costuma ter complicações.”