Especialistas e setor produtivo querem revisão urgente do atual modelo de gás no Paraná

Especialistas, entidades do setor produtivo e consumidores afirmam que o modelo atual que rege a concessão de gás no Paraná precisa ser revisto e modificado com urgência. O atual contrato se encerra em 2024 e o governo estuda renovar o contrato com a Compagas, atual concessionária, já no ano que vem. A Compagas é uma empresa pública de capital misto, cujos acionistas são a Copel, a japonesa Mitsui Gás e a Gaspetro.

A necessidade de mudanças foi a tônica da audiência pública “Debate sobre o novo Plano Estadual do Gás” promovida pela Assembleia Legislativa do Paraná por iniciativa do deputado Homero Marchese (PROS).

Foto: Thais Faccio/Alep
Foto: Thais Faccio/Alep

“O melhor para o paranaense é oferecer o insumo com um custo mais baixo para que novas empresas possam vir para o estado e para que as que estão aqui permaneçam com condições de competir. Por isso esse debate é fundamental”, disse o deputado.

Gerente de Assuntos Estratégicos da Federação das Indústrias do Paraná (FIEP-PR), João Arthur Mohr, lembrou que o atual contrato, fechado em 1994, possui taxas de retorno altíssimas, de 20% sobre o investimento e sobre o custeio, que não fazem mais sentido estruturalmente. “Era um modelo muito para o lado pró-concessão e não pró-usuário. Temos que construir um novo modelo do mesmo que fizemos com o pedágio”, destacou.

Mohr destacou que o gás da Compagas é o segundo mais caro do Brasil. Na comparação com os vizinhos São Paulo e Santa Catarina, por exemplo, o metro cúbico do gás paranaense está respectivamente 23% e 29% mais caro. O gerente da Fiep também ressaltou que o setor industrial responde por cerca de 80% da demanda por gás no estado.
Adriano Farias Lorenzon, diretor da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e Consumidores Livre (Abrace), vê na próxima licitação uma “janela de oportunidade” para o Paraná. “Esse é o momento para o Paraná sair dessa posição inglória, até porque outros estados só vão celebrar novos contratos lá por 2040”, disse.

O presidente do Sindicato da Indústria de Vidros Cristais Espelhos Cerâmica Louça e Porcelana no Paraná (Sindilouça-PR), Fábio Germano, foi pelo mesmo caminho e alertou que a continuidade do atual modelo vai afastar empresas e empregos do estado. “É a realidade nua e crua dos números. Isso acarreta na arrecadação de impostos e na geração de empregos. Estamos perdendo competitividade. Para o nosso setor a matriz energética é fundamental e precisamos de taxas mais baratas para continuar a investir no estado.”

A supervisora jurídica da Incepa Revestimentos Cerâmicos, Cintia Mombach, afirmou que a empresa planeja “quadriplicar” investimentos no ano que vem. “Temos intenção de fazer isso no Paraná, mas para isso precisamos de algumas condições. É urgente termos tarifas competitivas. Se vamos antecipar a renovação precisamos de algumas medidas já para o ano que vem. É urgente a equalização das margens sobre o metro cúbico do gás da Compagas”, afirmou Cintia, que também cobrou o repasse, para as empresas consumidoras, de valores obtidos pela Compagas com uma decisão judicial que considerou indevidos uma série de impostos cobrados pelo governo federal. Essa cobrança, explica a supervisora jurídica, estava embutida no preço pago pelos consumidores. Cíntia também defendeu a troca do índice de reajuste da tarifa do IGP-DI pelo ICPA.

O argumento de Cintia foi corroborado pelo advogado e consultor em Regulação, Frederico da Silveira Barbosa. “No nosso entendimento são privilégios injustificados concedidos à atual concessionária. A utilização do IGP-DI que é totalmente inapropriado, a taxa de retorno de capital de 20% e a não-devolução do dinheiro dos impostos, que foram pagos pelos usuários.”

DIÁLOGO
O presidente do Sindicato das Indústrias de Papel, Celulose e Pasta de Madeira para Papel, Papelão e de Artefatos de Papel e Papelão do Estado do Paraná (SINPACEL), Rui Brandt, defendeu o diálogo entre as partes envolvidas para buscar o melhor cenário para o setor industrial paranaense. “Precisamos de novas políticas voltadas para o desenvolvimento industrial. E o estado do Paraná tem nas mãos um instrumento de desenvolvimento, que é o novo contrato de licitação para a distribuição do gás natural, adequado aos interesses de todas as partes envolvidas. A indústria de celulose não quer vantagens, mas sim todas as condições para competir no mercado e para trabalhar e contribuir com o estado do Paraná”, disse.

Governo diz que novas tarifas vão valer já para 2024

O secretário-executivo da Casa Civil do Paraná, Marcelo Curado, afirmou que a modelagem da nova concessão para a exploração do mercado de gás passa a valer para 2024 e não para 2028, como inicialmente estava previsto no Plano Estadual de Gás desenvolvido pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), contratada pelo governo para a análise.

“Já começamos dessa maneira em 2024. A ideia é passar do modelo Cross Plus (taxa fixa de contrato) para as regras da PriceCap (modelo de taxa com remuneração menor reajustado a cada cinco anos) e vamos ter processo de convergência para dentro da margem nacional. Provavelmente vamos chegar a menos da metade [do valor cobrado pelo metro cúbico do gás] do que temos hoje”, destacou.

Curado, porém, observou que esse processo “não é feito do dia para a noite”. “Há diferença entre quem tem malha instalada e quem precisa instalar. Nós temos a orientação do governador Ratinho Junior de continuar com a interiorização do gás natural. Precisamos levar adiante o investimento.”

Ele diz que a prorrogação do contrato com a Compagas foi sugerida pela Fipe com base em “estudos técnicos”.

TRAÇADO E ESCALA
O diretor técnico-comercial da Compagas, Rafael Longo, atribui ao próprio traçado do gasoduto de transporte no Paraná uma das diferenças estruturais do estado para com seus vizinhos. “Aqui passou pela parte mais estreita do estado deixando muito concentrado o serviço em Curitiba e região. Temos um problema de escala que acabou deixando o preço mais alto”, justifica.

Longo diz que a empresa tem “plena consciência” de que a empresa precisa ser mais competitiva na sua margem de distribuição, mas afirmou que isso não pode acarretar em qualquer risco para a distribuição segura do insumo.

Ele ressaltou que medidas emergenciais estão sendo adotadas para beneficiar o usuário, mas descartou reduções de tarifa imediatas e devolução de valores relacionados aos impostos federais.