A história dos pedágios no Paraná mais parece uma novela, daquelas longas, entediantes e nas quais o telespectador – no caso, o usuário das rodovias – têm sempre a sensação de estar sendo tapeado para que o fim demore a chegar.
Desde 1997, quando os contratos de pedágio no Paraná foram firmados, a população assiste com perplexidade aos principais atores dos contratos (Governo Estadual, Justiça Federal, Ministério Público Federal, Assembleia Legislativa e Tribunal de Contas) empurrarem um ao outro a responsabilidade de por fim a uma história de omissão e incompetência.
Como toda novela, contudo, essa também apresenta alguma novidade de vez em quando. Desde que escrevi meu último texto sobre o assunto (“Sete fatos sobre o pedágio no Paraná”), um novo fato envolvendo os pedágios no Estado surgiu. Depois de manter suspensas as ações judiciais envolvendo as concessionárias por mais de três anos, sob o pretexto de negociar com as empresas e obter a redução das tarifas, o Estado, agora, indica que vai manter tudo como está.
Por meio de uma recente medida, o Governo, com o apoio do Tribunal de Contas do Estado (TCE), dá a entender que vai ignorar os relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU) e do próprio TCE que apontaram em 2012 a necessidade de reequilibrar os contratos e reduzir o pedágio. Ensaia-se um verdadeiro anticlímax para os contratos de pedágio do Estado, e o presente artigo explica por que.
Nos capítulos anteriores…
Antes de analisar o que o Poder Executivo prepara para os pedágios no Estado, vale a pena ver de novo o histórico das concessões rodoviárias no Paraná. Um resumo dos principais atos envolvendo os contratos é apresentado a seguir.
Quem quiser se aprofundar no assunto e obter maiores informações sobre a história de nossas concessões pode obtê-las no relatório preliminar de auditoria que o TCE produziu em 2012. O documento, do qual fui um dos redatores, é público e foi disponibilizado pelo próprio Tribunal neste link. O documento também pode ser acessado aqui.
Enredo
Os dois maiores problemas dos contratos de concessão rodoviária do Paraná surgiram logo com o início da cobrança dos pedágios, em 1998. O primeiro deles foi o alto valor das taxas internas de retorno (TIR) das concessões garantidas às empresas. As taxas variavam, aproximadamente, de 16% a 18%.
A TIR é um conceito contábil bastante conhecido e indica a rentabilidade esperada de um determinado negócio. De acordo com a ciência econômica, ao escolher entre duas ou mais opções de investimento, um investidor deve escolher aquela que lhe garanta o maior retorno. O cálculo deve considerar o retorno que se pode obter simplesmente mantendo-se o valor do investimento aplicado em uma instituição financeira, o que significa que um negócio, para ser atraente aos olhos de um investidor, deve apresentar uma TIR superior àquela encontrada em aplicações seguras do mercado.
Em 1998, uma TIR no patamar daquelas fixadas para os contratos de concessão rodoviárias do Estado era razoável. Os tempos da economia do país eram outros. A taxa Selic (taxa básica de juros de nossa economia), especialmente, era muito mais alta do que a praticada hoje em dia.
O risco Brasil (índice que mede o grau de insegurança de investimento no país) também era muito mais elevado. À época, a economia nacional ainda dava os primeiros passos após a estabilização inflacionária provocada pelo Plano Real, e ainda havia grande desconfiança sobre a capacidade dos agentes econômicos do país de honrar os seus contratos.
Graças à sensível melhora da economia brasileira e do avanço institucional do país nos últimos anos, os principais contratos de concessão elaborados no Brasil atualmente, inclusive os da nova fase do programa de concessões da União, praticam TIRs inferiores a 10%.
Em 1998, outro significativo agravante pressionava a TIR dos contratos de pedágio do Estado pra cima: nunca se havia tentado no Brasil um programa de concessões rodoviárias do porte que o Paraná lançava.
Sem poder contar com exemplos anteriores de outros entes da federação, o Paraná optou por elaborar um programa de concessões extremamente “pesado”, que incluia um longo caderno de obras e serviços, além de fixar uma TIR única para vigorar por todo contrato, independentemente da possível evolução da economia do país no futuro.
Hoje em dia, a opção dos principais programas de concessão do Brasil tem sido a adoção de um caderno inicial de obras mais enxuto, com a inclusão de novos investimentos no curso da concessão. Com isso, abre-se espaço para a adoção de fluxos de caixas exclusivos para cada nova obra ou serviço inserido no contrato: os chamados de fluxos de caixa marginais.
Atualmente, além disso, também se procura adotar estratégias que permitam calcular os custos de cada investimento e a remuneração da concessionária com base no efetivo estado da economia no momento da obra ou serviço. A principal medida nesse sentido é a equiparação da TIR ao custo médio ponderado de capital de cada investimento (o conceito de custo médio ponderado de capital também é conhecido pela sigla WACC, que designa o termo inglês Weighted Average Cost of Capital). A conta pondera o custo do capital da concessionária empregado no investimento com o custo de capital de terceiros.
Por força da Resolução n.º 3.651/2011 da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), as concessões rodoviárias federais, atualmente, devem aplicar tanto o conceito de fluxo de caixa marginal quanto o conceito de custo médio ponderado de capital. Ambos os conceitos, além disso, foram ratificados pelo TCU no acórdão n.º 2.927/2011 do Tribunal Pleno, que determinou a aplicação da Resolução n.° 3.651/2011 da ANTT não apenas na hipótese de novas concessões, como também no caso de concessões anteriores que envolvam novos investimentos.
O segundo grande problema dos contratos de concessão rodoviária do Paraná surgido ainda em 1998 foi a alteração unilateral dos contratos determinada pelo então Governador do Estado, Jaime Lerner. Concorrendo à reeleição e receoso do impacto eleitoral que a cobrança do pedágio (iniciada poucos dias antes) poderia provocar, o Governador baixou forçadamente as tarifas do pedágio pela metade.
Todas as concessionárias ingressaram na Justiça contra a medida, e, com isso, teve início a longa litigância envolvendo as concessionárias e o Estado do Paraná, que acabou produzindo centenas de ações ao longo do tempo.
Primeiro, segundo e terceiro atos
Depois de amargar derrotas na Justiça, o Governo do Estado do Paraná, já reeleito, admitiu reestabelecer as tarifas originais do pedágio. Isso aconteceu em 2000, quando o Poder Executivo assinou com as concessionárias o primeiro aditivo aos contratos. O aditivo anulou o ato unilateral de 1998 e fez algumas alterações no caderno de obras e serviços das concessões.
Sem qualquer justificativa aceitável, contudo, o aditivo também alterou as TIRs praticadas nas concessões, subindo-as em alguns pontos percentuais. Com isso, as TIRs dos contratos paranaenses passaram a variar, aproximadamente, de 19% a 21%.
O aumento foi proposto por peritos contratados pelo próprio Estado, que alegaram que o ato unilateral de 1998 havia alterado as condições de financiabilidade do negócio e prejudicado as concessionárias. Nenhuma demonstração da afirmação, contudo, foi feita. O Estado ou seus peritos não apresentaram nenhuma pesquisa de índices ou documento de preços para embasar suas conclusões.
Em 2002, Estado e concessionárias voltaram a se reunir e definiram a elaboração de um segundo aditivo ao contrato. Alegando a incidência de novos tributos sobre as atividades das empresas e a ocorrência de outros eventos específicos que teriam importado em perda de receitas, as concessionárias obtiveram do Governo um novo acordo, que manteve os preços dos pedágios, mas eliminou ou postergou investimentos nas rodovias. Foram mantidas as mesmas TIRs reajustadas pelo primeiro aditivo.
Em 2003, o Governo do Estado foi assumido por Roberto Requião, que fez do bordão “o pedágio baixa ou acaba” o mote de sua campanha. Durante os 8 anos que permaneceu no comando do Estado, Requião, de fato, buscou enfrentar as concessionárias e obter delas uma redução do pedágio. Fez isso com tal imprudência, contudo, que, ao final de seu mandato, a situação dos contratos ficou pior do que antes.
Acertadamente, o Governo Requião moveu contra as concessionárias a ação n.º 2005.70.00.007929-7, da 2.ª Vara Federal de Curitiba, que buscou anular os efeitos dos dois aditivos ao contrato. Dada a demora do processo judicial, contudo, o Governo não pôde vê-la julgada. Aliás, a ação ainda tramita na Justiça Federal e ainda não foi sequer sentenciada em 1.º grau (a ação encontra-se suspensa desde 2011, a pedido do atual Governo do Paraná, como veremos abaixo).
O Governo Requião, porém, também adotou medidas incorretas em relação aos contratos, como a negativa sistemática de reajustes anuais às tarifas. Tais reajustes são previstos expressamente nos instrumentos contratuais e têm por base uma cesta de índices inflacionários cuja aplicação deve ser objetiva e automática. Assim, negados os reajustes contratuais, as concessionárias procuravam o Poder Judiciário e tinham prontamente o direito a eles reconhecido, restando para o Estado um passivo a ser reposto no contrato.
Esse passivo, aliás, obrigou o próprio Governo do Estado, posteriormente, a adotar medidas que o contrabalanceassem. Foi por isso, por exemplo, que o Estado celebrou com a concessionária Ecocataratas, em 2004, um termo que desobrigou a empresa de investimentos, em troca do não aumento das tarifas (a empresa é responsável pela concessão da BR-277 entre Guarapuava e Foz do Iguaçu). A notícia, que tem sido explorada neste período eleitoral, é, portanto, verdadeira.
Novos atores sobem ao palco: o Governo Beto Richa, o TCE e o TCU
Em 2011, Beto Richa foi eleito Governador e adotou como primeira medida relacionada aos pedágios a suspensão de todas as ações envolvendo Estado e concessionária. O pretexto era negociar com as empresas, buscando-se principalmente a redução das tarifas.
Em 2012, o TCE, após um trabalho inédito, divulgou um relatório indicando que as tarifas do lote de concessão operado pela empresa Ecocataratas estavam 30% além do preço devido. O Tribunal concluiu que o primeiro e o segundo aditivos ao contrato não poderiam ter alterado o equilíbrio econômico-financeiro da concessão e, assim, deveriam ser desconsiderados no cálculo das tarifas.
A expressão equilíbrio econômico-financeiro designa a relação entre encargos da concessionaria e sua remuneração. De acordo com a Constituição Federal e a Lei de Licitações (Lei n.º 8.666/93), essa relação deve permanecer constante durante toda a vigência do contrato firmado com o Poder Público. Como apontou o TCE em seu relatório, no momento da celebração dos dois aditivos ao contrato, não houve qualquer demonstração por parte dos envolvidos de que a TIR da concessão deveria ser alterada.
Após chegar a essa constatação, o TCE utilizou como critério para apontar os valores devidos das tarifas a TIR original do contrato, definida em 1998. Apesar de a taxa ser muito alta para os padrões atuais, a opção por manter a TIR original como critério para reequilíbrio do contrato demonstrou comprometimento do TCE com a segurança jurídica. Ou seja, pode-se dizer que o trabalho do TCE foi extremamente conservador. Mesmo assim, os resultados do relatório do Tribunal apontaram o forte desequilíbrio de 30% no preço dos pedágios.
Na mesma época, o TCU também apresentou o resultado de sua auditoria sobre os contratos de concessão rodoviária do Estado. Partindo de pressupostos menos conservadores do que os utilizados pelo TCE, o TCU também indicou desequilíbrio nas tarifas em prejuízo do Estado, mas determinou que os contratos passassem a ser reequilibrados com base em TIRs praticadas no mercado.
O resultado da auditoria do TCU importaria em uma redução tarifária superior à determinada pelo TCE, mas o Tribunal de Contas nacional, ao invés de apontar por conta própria os novos valores das tarifas, preferiu deixar a missão a cargo do próprio Estado. O trabalho nunca foi feito.
Apesar dos relatórios do TCE e do TCU, o Estado do Paraná, desde 2011, continua mantendo suspensas as ações contra as concessionárias, sob a justificativa de que as negociações com as empresas permanecem. Para o fato, tem sido indispensável a colaboração da Justiça Federal, que, em boa parte das ações, tem aceitado os sucessivos pedidos de suspensão processual assinados por Estado e concessionárias, apesar de o Código de Processo Civil ser claro quanto à limitação da suspensão de feitos processuais pelo prazo máximo de 180 dias.
O que acontece nos autos n.º 2005.70.00.007929-7, da 2.ª Vara Federal de Curitiba, por exemplo, é emblemático. O processo, um dos mais importantes envolvendo a discussão do reequilíbrio das concessões, foi suspenso em 2011, quando estava prestes a começar a perícia que definiria a TIR a ser praticada nos contratos, e, até agora, rigorosamente mais nada foi produzido nos autos. A movimentação do processo pode ser acompanhada pelo site da Justiça Federal do Paraná.
O anticlímax: a tentativa frustrada de prorrogação dos contratos e a nova estratégia adotada pelo Estado
Quando a população do Paraná já imaginava ter visto de tudo em relação às concessões rodoviárias do Estado, a imprensa divulgou no ano passado que o Poder Executivo cogitava prorrogar os atuais contratos. A medida foi proposta por um trabalho privado de auditoria que custou aos cofres públicos R$ 3 milhões. Após o fato ter vindo à tona, contudo, o Estado, aparentemente, desistiu do projeto – sem dizer, porém, quem se responsabilizaria por indenizar o erário pelo dinheiro gasto na contratação da auditoria.
Uma eventual prorrogação dos contratos, de qualquer forma, enfrentaria um grave obstáculo, qual seja, a necessidade de concordância da União. As rodovias pedagiadas no Estado são, em sua grande maioria, federais, e foram delegadas à exploração pelo Estado do Paraná apenas até o fim da vigência dos atuais contratos. Assim, qualquer prorrogação dos atuais instrumentos contratuais depende, necessariamente, da aquiescência do governo federal, medida que pode ser difícil de conseguir, especialmente se a Presidência da República e o Governo do Estado forem ocupados por grupos políticos distintos.
Depois da tentativa de prorrogar os contratos, o Estado, atualmente, tem outra estratégia para as contratações. Ela representa o novo capítulo da novela dos pedágios no Estado.
No final do ano passado, por meio da Agência Reguladora dos Serviços Públicos Delegados de Infraestrutura do Paraná (AGEPAR), o Estado do Paraná, sem qualquer alarde, endereçou uma consulta formal ao TCE a respeito dos contratos. A AGEPAR perguntou ao Tribunal como, afinal, deveria resolver o impasse envolvendo o Estado e as concessionárias. O pedido deu origem à consulta n.º 840955/13 da Corte, cuja movimentação pode ser acompanhada pelo site da instituição.
Quando uma entidade pública do Estado faz uma consulta ao TCE, a resposta oferecida vincula o exame do Tribunal sobre o assunto no futuro. Ou seja, caso a consulente siga a orientação formulada, o ato que ela praticar não poderá ser considerado irregular pelo Tribunal. Além disso, embora não sejam vinculantes para outras entidades, as respostas do TCE frequententemente são utilizadas pela consulente como justificativas para a adoção de determinada medida diante de outros órgãos de controle, o Poder Judiciário e a opinião pública.
Assim, boa parte das consultas dirigidas à Corte contém um indisfarçável desejo de que a resposta ratifique uma tese específica defendida pela consulente.
No caso da consulta n.º 840955/13, esse desejo ficou patente. No processo, a AGEPAR fez duas perguntas principais ao TCE: 1- caso o Poder Judiciário não se manifeste sobre a validade dos aditivos contratuais, esses aditivos deveriam continuar a ser aplicados pelo Poder Executivo?; 2- na hipótese de inserção de novos investimentos nas rodovias, a Administração poderia utilizar os parâmetros recomendados hoje pela ANTT e o TCU para o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos? (veja, acima, um resumo dos entendimentos dos dois órgãos a respeito do assunto).
Em sua resposta, o TCE disse exatamente o que a AGEPAR procurava ouvir, ratificando praticamente na íntegra o parecer da Diretoria Jurídica da agência que acompanhou a consulta. O TCE disse, então, à AGEPAR que: 1- até que haja decisão judicial contrária, os contratos e seus aditivos são plenamente vigentes e, assim, devem ser aplicados pelo Poder Executivo; e 2- o Estado do Paraná pode, sim, aplicar os parâmetros para reequilíbrio indicados pela ANTT e pelo TCU, empregados no caso de novos investimentos.
A sessão de julgamento da consulta n.º 840955/13 ocorreu no último dia 12 de junho de 2014. As sessões são públicas e filmadas, e os vídeos podem ser acessados no site do próprio TCE. A parte final da decisão do Tribunal no processo, elaborada pelo Relator Conselheiro Nestor Baptista, está reproduzida no vídeo veiculado no início deste artigo. A íntegra do acórdão redigido pode ser acessada aqui.
Com a recente resposta à consulta n.º 840955/13, o TCE, na prática, anula os resultados do relatório de auditoria que a própria Corte elaborou em 2012 (processo da auditoria n.º 39.864-3/11, também relatado pelo Conselheiro Nestor Baptista). Ou seja, depois de dizer que os contratos deveriam ser reequilibrados, porque os aditivos contratuais haviam sido ilegais, por terem aumentado indevidamente as TIRs das concessões, o Tribunal, agora, diz que não pode dizer se houve qualquer problema com eles.
Com o julgamento da consulta n.º 840955/13, o TCE, assim, garante ao Estado do Paraná um salvo conduto para continuar fingindo à população do Paraná que procura uma solução consensual para os problemas dos contratos de pedágio no Estado.
Ora, o próprio Estado do Paraná, há mais de três anos, mantém suspensas as ações judiciais que discutem a validade dos aditivos de 2000 e 2002, inclusive a ação n.º 2005.70.00.007929-7, da 2.ª Vara Federal de Curitiba, a mais importante delas. Presumia-se, portanto, que o Governo do Estado estivesse insistindo na ilegalidade dos aditivos em sua negociação com as concessionárias, porque é isso, sem dúvida alguma, o que deveria ser feito por força da legislação e do interesse público.
Com a consulta da AGEPAR, contudo, vê-se agora que a suspensão das ações sob o pretexto de negociar com as empresas era mero jogo de cena do Governo, que desejava mesmo que as ações não fossem julgadas. Amparado na resposta sob medida dada à consulta n.º 840955/13 pelo TCE, o Governo do Estado, a partir de agora, poderá alegar que, enquanto as ações não forem julgadas, não estará fazendo nada mais do que cumprindo os contratos. O cinismo é completo. É como se um indivíduo fechasse um quarto por dentro e alegasse não poder sair, sob a desculpa de estar trancado.
É importante ressaltar que a parte da resposta do TCE que recomenda a aplicação dos parâmetros para reequilíbrio contratual da ANTT e do TCU produz impacto pouco significativo para as concessões. Os parâmetros só devem ser aplicados no caso de novos investimentos acrescidos à concessão, e o programa de concessões do Paraná, como indicado acima, previu desde o início um longo encargo de obras e investimentos a serem realizados pelas concessionárias.
Assim, ainda que os conceitos de fluxo de caixa marginal e custo médio ponderado de capital passem a ser aplicados pelo Estado, garantindo-se a aplicação de uma TIR equiparada à praticada no mercado hoje em dia (e muito mais baixa do que a TIR original dos contratos), a medida valerá apenas para novos investimentos.
A propósito, foi isso o que ocorreu em 2012, por exemplo, com a duplicação de 14 kms de rodovia entre Matelândia e Medianeira, obra que foi anunciada pelo Governo do Estado como exemplo das vantagens que uma solução consensual entre Poder Público e concessionárias poderia produzir.
Além disso, deve-se frisar que a celebração de acordo entre o Estado e determinada concessionária para a realização de novos investimentos não representa nenhum ato benemérito por parte da empresa. A concessionária também obtém ganhos com a medida, já que aumenta a quantidade de serviços a prestar ao Estado e é remunerada por isso. Ademais, a empresa não precisa participar de licitação para celebrar essa contratação suplementar, o que é uma grande vantagem.
Uma última notícia que veio à tona recentemente relacionada às ações judicias entre Estado e concessionárias dava conta de que a Procuradoria do Estado (PGE) pedira a desistência de todos os processos entre as partes. Para comprovar o fato, divulgou-se, inclusive, o teor de um documento que a PGE teria enviado à ratificação do Governador.
Analisando-se o teor do documento, contudo, nota-se que a notícia é falsa. O documento da PGE sugere tão somente a desistência das ações que discutem os reajustes inflacionários anuais, ações em que a sucumbência do Estado é praticamente certa. Assim, a providência almejada pela PGE não é prejudicial ao interesse público, inclusive porque condiciona a manifestação de desistência por parte do Estado à renúncia de certos créditos pelas concessionárias.
Epílogo? Só depois das eleições…
Depois do anticlímax da consulta n.º 840955/13 do TCE, o final da novela das concessões rodoviárias no Paraná está adiado para depois das eleições. Muito provavelmente, o último capítulo dessa história será escrito pelo governador que comandar o Estado a partir do ano que vem. Seu mandato durará até 2018, ou seja, até três anos antes do termo final das concessões, que vencem em 2021.
De acordo com as pesquisas, os dois candidatos mais cotados para assumir o cargo são o atual governador Beto Richa, que concorre à reeleição, e o senador e ex-governador Roberto Requião. Caso o governador Beto Richa se sagre vitorioso, os fatos analisados neste texto indicam claramente que o Estado vai manter os contratos de pedágio rigorosamente como estão, adotando o fluxo de caixa marginal e o custo médio ponderado de capital apenas no caso de novos investimentos. Com isso, é bastante provável que o inequívoco desequilíbrio dos contratos, provocado pelos aditivos contratuais de 2000 e 2002, seja simplesmente ignorado.
Caso o governador vitorioso seja Roberto Requião, as reiteradas posições sobre o pedágio manifestadas pelo atual senador indicam que as ações envolvendo Estado e concessionárias serão retomadas, o que, inequivocamente, é a medida certa a fazer considerando a legislação e o interesse público. Não é possível afirmar, contudo, se a ação produzirá resultados proveitosos para a população. Da última vez que Roberto Requião comandou a investida, o pedágio não baixou nem acabou, e alguns investimentos ainda foram removidos da concessão.
De minha parte, como deputado estadual pelo Paraná, quero continuar a contar a história do pedágio no Estado, lançando luz sobre um dos mais relevantes assuntos públicos do Paraná, que, contudo, não é tratado de forma transparente pelo Governo estadual. Também adotarei todas as medidas que estiverem a meu alcance para impedir que a epopéia dos contratos de pedágio termine no anticlímax de que falei.
É preciso fazer justiça com a população paranaense, e isso pressupõe, necessariamente, que o equilíbrio original dos atuais contratos seja retomado, impedindo que os atos ilegais praticados ao longo da concessão sejam ignorados.